terça-feira, maio 25, 2004

É um problema da corrupção? Ou existe outro motivo?

Desde o governo FHC que se investigava a corrupção no Ministério da Saúde. Esta herança "bendita" não parece ter sensibilizado o governo atual mas, de qualquer forma, as demissões começaram. Pode ser que seja tão arbitrário quanto fechar bingos, pode ser que seja algo correto mas, enfim, o fato é que a imprensa forçou a barra.

Segundo a notícia seguinte: Fraudes da Máfia fazem cair as doações de sangue - Terra - Brasil.

Vamos lá. Eu concordo que pode haver uma queda de doações por causa da corrupção do governo. Mas como fizeram a pesquisa? Perguntaram aos médicos. Somente isto.

Opinião por opinião alguém poderia dizer que é por causa de uma greve de ônibus. Ou porque o carioca (se for no RJ) tem medo de andar de ônibus. Ou porque o trânsito em São Paulo lotou. Ou porque é feriado.

Simplesmente não dá para saber.

Para se estudar uma política pública de forma séria, temos de ir além da opinião dos médicos ou dos palpites de repórteres ávidos por manchetes que os liguem a um grande tema.

Um fato muito mais interessante é poder observar a doação diária de sangue e sua relação com notícias. Veja bem, eu não nego (até acho que concordo com a idéia) o argumento dos palpites coletados pela imprensa. Mas, então, o título da matéria deveria ser: "Médicos atribuem queda da doação de sangue à máfia da saúde".

Irresponsável mesmo é fazer esta propaganda gratuita para o governo que, afinal, está errada e não ajuda se o objetivo for o de aumentar as doações de sangue. Agora, se o objetivo do Portal Terra (ou da TV Globo) é agradecer pela ajuda do BNDES (ou algo assim), bem, nota dez.

Cientistas sociais minimamente comprometidos com os métodos científicos deveriam se preocupar mais com a deseducação que, muitas vezes, a imprensa gera. Se bem que, com o advento dos blogs, este efeito é contrabalançado em parte. Por que "em parte"?

Porque eu não tenho a mesma credibilidade e reputação de um portal Terra (uma pessoa anônima, diga-se de passagem). Também não tenho a rede de informantes que um jornalista consegue (minha agenda tem menos números). Enfim, embora isto seja absolutamente irrelevante, não tenho diploma de jornalista.

Mas eu sei a diferença entre palpite e evidência minimamente comprovadora de hipóteses. E o que eu li não ajuda muito a entender o que causou uma queda na doação de sangue. Um trabalho interessante (se você conhece os trabalhos de Bruno S. Frey, notadamente o livrinho "Not just for the money") seria verificar os determinantes da doação de sangue no Brasil e como os mesmos respondem à corrupção ou a falhas nas políticas públicas.

Pode ser mais específico, mas o jornalista que entrevistasse o sujeito que fizesse este estudo poderia contribuir mais para a sociedade do que o que fez a matéria citada.

Menos um ponto para os jornalistas.