sexta-feira, agosto 13, 2004

O aluno Preguiça e o professor Supimpa (I)

Em mais uma tentativa de não estudar, o famoso aluno Preguiça tenta se fazer de vítima na matéria de Técnicas de Pesquisa em Economia.

- Professor Supimpa, acho muito difícil este negócio de monografia.

- Por que, aluno Preguiça?

- Porque tenho de ler muita coisa. Se tiver de fazer sobre inflação, terei de ler muita coisa! Por que o senhor não deixa a gente comprar um trabalho pronto? É o mercado em ação!

Risos na sala de aula. O professor Supimpa pensa consigo mesmo sobre quantas vezes já ouviu esta piada. E então responde ao protótipo de Bicho-Preguiça.

- Veja bem, meu caro aluno. Você não estuda Economia?

- Sim.

- Você não se acha um economista em potencial?

- Claro!

Neste momento, vários dos colegas em sala já se entreolham, pensando se são mesmo potenciais economistas competentes ou apenas economistas em potencial. Alguns riem ironicamente em voz baixa pois já conhecem o professor Supimpa.

- Pois bem. Você aprendeu microeconomia, certo?

- Claro.

O aluno olha arrogantemente para o professor pensando em como ele pode achar que ele, aluno superior, membro da elite da cidade, pode "não saber algo de microeconomia". Que disparate!

- Você sabe fazer cálculo de máximos e mínimos, certo?

- Óbvio! Não entendo! Qual seu objetivo com estas perguntas?

- Calma, não precisa ficar vermelho. Apenas pense. A monografia é um trabalho que demanda tempo, certo?

- Sim.

- E neste tempo você terá de, ao mesmo tempo, pensar, ler e resumir, o que é bem cansativo, não?

Neste momento o aluno Preguiça imagina que o professor cederá às suas investidas preguiçosas por um mundo mais folgado, sem trabalho, pensamento ou esforço. Nosso herói comete o mesmo erro de sempre...(o que você esperaria de um bicho preguiçoso? Êita!)

- Pois veja, antes, não havia internet. Isto dificulta mais ainda seu trabalho, não é?

- Claro! O senhor está me entendendo!

- Creio que você é que agora me entende, não?

- ??

- Ora, você é racional, não é burro e quer ler apenas o suficiente para fazer sua monografia, certo?

- Ah, bem, sim...

O aluno Preguiça balbucia? Sim, leitor. Ele, na verdade, gostaria de não fazer nada, mas fica mal para seus futuros potenciais competidores mostrar que é pouco esforçado agora: lucros potenciais também são importantes para sua futura viagem à Malásia para uma festinha do cabide com algumas prostitutas (ou seria Tailândia?)...

- Pois! Sendo racional, inteligente e esperto, você só vai ler até o ponto em que o conhecimento marginal adquirido seja igual ao custo marginal que você tem, não? Antes disso é desperdiçar informação e, depois, claro, é informação inócua.

- Humm...o senhor tem razão. Mas, mesmo assim, eu poderia comprar o trabalho já pronto!

- É verdade. Você pode fazer isto, mas aí não é o mercado funcionando, mas sim uma imitação distorcida do mercado. Lembre-se que o mercado só funciona e gera prosperidade se os direitos de propriedade estão bem definidos.

- Mas, professor..então?

- Calma. Lembre-se que a definição dos direitos de propriedade pode ser ineficiente.

- É, isto é verdade.

- Agora pense como economista, como homem de negócios: quem está mais capacitado para fazer uma monografia, um trabalho científico? Você ou um desconhecido que lhe promete um bom trabalho já pronto?

- Eu...


Rapidamente o Aluno Preguiça volta ao ataque. O desespero é sempre um incentivo...

- Mas o cara pode ser um Ph.D. corrupto. Não seria mais inteligente do que eu?

- Seria, com certeza. Mas suas ações alocam mal o capital intelectual pois ele desrespeita os direitos de propriedade das pesquisas ou de monografias individuais que foram feitos sob a função de produção, digamos assim, de diversos pesquisadores individuais que não foram consultados sob a permissibilidade de terem sua pesquisa plagiada. Se ele as vende para você sem a autorização dos autores, então aloca mal os recursos não?

- É, tem razão. Mas ele poderia fazer a pesquisa para mim. Ele pode ter uma equipe de estudantes que façam isso e me venda depois!!!

- Sim. Mas aí você acha que algum deles compraria uma pesquisa? Se o, digamos, "empregado-estudante" desta máfia sabe como fazer uma monografia e se ele precisar de uma, por que a compraria? Ele não se especializou nisto? Sai mais barato ele mesmo confeccioná-la. Neste caso, não faria muito sentido contratar estudantes para fazer o trabalho. Pode-se, isto sim, roubar os trabalhos alheios ou empregar gente desonesta para fazer isto.

- Humm... o senhor está certo, professor Supimpa.

- Lembre-se de que um mafioso deve sempre contratar mafiosos tão ruins quanto ele, porém devem ser menos inteligentes. Senão ele pode perder o poder. Você lembra de ter lido isto em "O Caminho da Servidão", de Hayek?

- Não. Eu não li este livro. Disseram-me que Hayek era neoliberal, burguês, globalizante, excludente e que ele não era filiado à FENAJ-CUT e nem ao Greenpeace.

- Bem, meu caro, você foi enganado. Em todos os casos, acho que agora percebeu melhor o ponto central da monografia, não? Diga-se de passagem, estas "qualidades" não deveriam te impedir de ler o autor. Você pode não gostar de idéias diferentes das suas, mas deixar de lê-las é perder uma boa chance de aprimorar seus conhecimentos e, quem sabe, sua ironia e bom humor.

- Sim, professor. Até que não é tão complicado...digo...é...mas... [silêncio]

- Sabe, eu acho que você é capaz. Você não é burro. Apenas um pouco preguiçoso. Se perceber o quanto poderá aprender, poderá corrigir este seu defeito e ser mais feliz do que é hoje.

- Muito obrigado, professor Supimpa.

Neste momento o aluno Preguiça percebe que a Economia que ele pensava dominar, não se aplica somente aos outros, mas a ele mesmo (o aluno Preguiça se acha um ser humano e, de fato, ele faz parte desta espécie!!!). Os colegas começam a pensar e percebem que a monografia é apenas mais um momento em suas vidas em que terão de tomar decisões ótimas. O domínio da Ciência Econômica passa, de certa forma, pela percepção de que nós não estamos apenas arrogantemente explicando as ações dos outros mas também as nossas.

Posfácio: este post foi inspirado em um trecho do livro do Duílio (o de Técnicas de Pesquisa em Economia). Aliás, num trecho ao final da p.65, escrito pelo próprio. Thanks Duilio por mais esta inspiração.