sexta-feira, novembro 19, 2004

Regulamentação do governo: o mau exemplo

Projeto de Salvação Nacional - Antonio Roberto Batista*

Finalmente alguém na Câmara Federal toma uma atitude realmente relevante para o bem estar da Nação! Vejam que não atinge apenas o estreito universo dos eleitores mas, principalmente, beneficiará o maior amigo do Homem. Não se trata do whisky, assim considerado pelo falecido poeta Vinícius de Moraes, mas do cão mesmo, tradicional companheiro a que a consagração popular concedeu esse título.

O Deputado Federal "Pastor Reinaldo" do PTB-RS apresentou um indispensável projeto de lei para proibir sejam dados nomes humanos aos animais de estimação, o que vem acontecendo, crescentemente, ao arrepio do respeito devido a ambas as partes. Meu velho amigo Luiz Peluso já havia me advertido quando soube que meu boxer fora "batizado", digamos assim, como Carlos Raimundo Popper, vulgarmente "Popper", homônimo, portanto, do nosso filósofo predileto. Nosso: meu e do Peluso, é claro. Os dois xarás não se conheceram.

O incrível dessa história é que, principiando a escrever este comentário, resolvi dar uma olhada no portal da Câmara dos Deputados para saber quem era este deputado e que outros projetos exóticos teria para nos oferecer. Para minha surpresa, descobri que se trata de parlamentar com um conjunto de excelentes contribuições em áreas como educação, saúde, segurança pública, proteção da fauna etc. Ao passar os olhos pelo conjunto dos seus 83 itens elencados, nota-se, claramente, que não é um deputado qualquer voltado para projetos irrelevantes ou folclóricos. Sua atuação parlamentar é de qualidade. Por que, então, perde tempo com uma idéia dessas? Realmente não sei. Quando escrevi "O adestrador de papagaios"1 achei que estava fazendo ficção.

Lembrei-me que o Dr. Cândido Prunes já nos revelou, nesta coluna, que dispomos de 555 diplomas legais envolvidos na regulamentação da feijoada e - também indispensável - que há uma lei no Rio de Janeiro determinando seja o papel higiênico feito exclusivamente a partir da celulose. Concluí que lá em casa vivemos cada vez mais imersos no mundo da contravenção, pois minha mulher, que faz uma deliciosa feijoada, ignora por completo esses cabalísticos 555 regulamentos e todos nós adorávamos o nosso Popper, da mesma forma a nossa Brenda Lee, sua jovem e irrequieta viúva. Quanto ao papel higiênico, não me preocupei tanto, pois parece que essa lei não alcança São Paulo.

Ficam mais duas perguntas. Primeira: por que nossos legisladores, pagos por nós, acreditam que lhes cabe reformar o mundo, os costumes mais privados, proteger-nos de nós mesmos e até regular o nome dos nossos bichinhos? Segunda: considerando que o deputado proponente se denomina "Pastor" Reinaldo, quem representará o interesse das diversas linhagens caninas que também utilizam esse título há bastante tempo?

* Diretor do Instituto Liberal